BAYARD TONNELI
IGOR COTRIM
GEAN QUEIROZ

Daqui pra frente um aviso, se você é uma daquelas pessoas que se incomoda com o prazer alheio, quando alguém conta uma conquista você duvida, vê um folião mais animado no carnaval logo conclui que ele deve estar bêbado e drogado, quando alguém está sorrindo é porque está querendo aparecer, se você acha que o paraíso e a plena felicidade não existem, então pode parar de ler por aqui mesmo, porque as linhas a seguir estão repletas de uma satisfação tão abundante que talvez nem Mick Jagger tenha sonhado, todos os acontecimentos apartir deste momento e em todos os segundos dos quatro dias seguintes são de uma magia inebriante, coisa para acordar a criança no peito e fazer um homem chorar por dentro a cada passo, a cada nova surpresa, um delírio cinematográfico tão inédito, que eu só posso buscar nas minhas referências algo entre Robin Hood, Peter Pan, O senhor dos anéis, Asterix e Obelix e todos aqueles filmes com piratas, castelos e cavaleiros tentando salvar a princesa, só que aqui não tem batalha nem dragão nem perigo algum nem indíce mínimo de stress, tudo está friamente preservado de não sei quantos milhões de anos atrás e batido no liquidificador com o que há de mais moderno, o antigo e a sofisticação, o rústico e o conforto, minhas primeiras impressões me levaram a lugares como Paraty, Santa Teresa, Ilha Grande, Búzios, mas aí eu posso jogar tudo isso junto neste cocktail misturado com uns anabolizantes poderosos, umas ervas finas e uns cogumelos potentes, e não adianta você falar ”_Haxixe bom esse que você levou hein Gean_”, não, não foi o haxixe, não foi o amor que trago dentro de mim e que senta ao meu lado e admira a paisagem comigo com lágrimas nos olhos, não foi isso, foi o lugar, então sem economizar nos superlativos, vou usar quase todos que conheço numa só frase e sem me preocupar com gramática vou repeti-los incansavelmente até o final deste texto
foi o lugar, absolutamente único, completamente fantástico, totalmente mágico, deslumbrantemente belo, incrivelmente imprevisível…eu avisei pros céticos pararem lá em cima, mas se você veio até aqui e quer seguir junto comigo, é porque assim como eu, você sabe que a vida nos reserva surpresas e prazeres que estão muito além de nossas expectativas e que todos nós merecemos ser surpeendidos pelo novo e que se um amigo está feliz e compartilhando isso com a gente, seja de que forma fôr, isso acende a chama da felicidade dentro da nós, e então seguimos todos juntos, cada um com suas conquistas ao redor do mundo que é tão grande tão surpreendente tão misterioso, e quando realmente sentimos essa conexão dentro da gente, a comunicação chega a tornar-se telepática, e ficamos felizes e pensamos em alguém distante sem que este alguém nos conte nada, por isso meus amigos sintam-se felizes comigo, pois estou transbordando como talvez nunca na vida. De uma só vez entendi tudo o que os suecos são, porque, como, o que eles pensam e de onde vem isso tudo, porra, que loucura que é a cultura de um povo, a história constrói a vida de uma forma fantástica. Hank é um vicking fudidamente autêntico e visceral, ele sabia tudo, sabia que a previsão do tempo garantiu sol absoluto nos próximos dias, sabia que iríamos chegar em plena abertura da semana medieval, o maior encontro deste tipo na Escandinávia, comprou barraca nova, trouxe o edredom, fogãozinho, as batatas, o presunto, o atum, as bicicletas, as cervejas, o vinho e a latinha de 51 contrabandeada do Brasil, tá bom o haxixe fui eu quem trouxe, mas eu sempre entro com essa parte, ele sabia tudo e só me deu a dica de que era um dos lugares mais bonitos da Suécia, tá bom, a Suécia é linda, Estocolmo foi o máximo que eu havia visto até agora, mas essa ilha é uma coisa fora da realidade, no que se refere a magia, ao antigo, a cultura sueca, a história que está totalmente viva nas suas ruelas de pedras e túneis e ruínas e muralhas e castelos, e ao mesmo tempo é mega realidade, no que se refere ao glamour, a estrutura do prazer montada em torno desta cultura tão autêntica, tudo isso de frente pro mar com kilômetros de praia e sol gritando. Cada nova esquina uma nova descoberta, cada praça, cada café, cada barzinho, e ainda curtimos um rock’n’roll num suterrâneo ali, e dançamos um eletro de primeira mais adiante, tudo lindo demais, porém ainda não tinha aparecido o sol até então e chovia de leve.
Mas na manhã seguinte, acordei botei a cara pra fora da barraca e o céu era de um azul cintilante, olhei em volta e pensei que estava em não sei que século atrás, eram vickings, magos, duendes, piratas, membros da côrte, plebeus, arqueiros, esfreguei os olhos mas eles continuavam lá, fui caminhando me misturando e vi que não era um ou outro que estava assim caracterizadoS, eram quase todos, famílias inteiras, esquentando o café no fogo, fazendo pão, sei lá, depois fui observando os contrastes, vi uma princesa falando no celular, um grupo de guerreiros posando pra foto, uns piratas ouvindo heavy metal e vários deles cheios de piercings e tatuagens, mas os trajes, totalmente fantásticos, não era fantasia, era de verdade, todos estão ali para celebrar e experimentar por alguns dias a forma como viviam seus antepassados. Os suecos definitivamente sabem acampar, eles trazem tudo e um pouco mais, montam uma casa inteira debaixo de uma árvore, alguns em seus trailers e outros em barracas de tudo quanto é jeito. Passeamos pela cidade que é um enorme museu vivo, tudo, cada cantinho, cada janela, cada pedra conta uma história, e dá-lhe vickings passando pra lá e pra cá, na feira onde era o centro do encontro de todos, acho que só tinha eu, o Hank e mais alguns gringos vestidos como em nosso século, era um desfile atemporal dos mais diferentes tipos históricos, e também as mais autênticas demonstrações do estilo de vida da idade média, as vezes me parecia que eu estava dentro de um desenho animado dos Flintstones, e era tudo tão de verdade, alguns exibiam longas barbas, as mulheres com cabelos até a cintura, crianças travando duelos de espadas, final da tarde armamos nossa cozinha na beira do mar, e era possível ver ao longo de toda a orla vários grupos reunidos fazendo a mesma coisa, cozinhando em fogueiras ou em fogãozinhos estilizados como o nosso, e admirando o pôr-do-sol, depois de três meses sem ver o sol direito, contemplar um entardecer espetaculoso como aquele numa ilha tão incrível realmente me deixou abobalhado de emoção, e comemos bebendo vinho branco, de longe uma gaita de fole soava para abençoar o dia, haxixe na mente, estávamos fudidos na alma. No domingo montamos nossas bicicletas e como bravos guerreiros e pegamos a estrada para dar um rolé pela ilha e ir até a principal praia de Gotland, foi mais de uma hora de pedalada, e eu tratei de avisar hank que ou a gente conseguia uma carona pra voltar ou eu ía dormir por lá mesmo, e que praia meus amigos, não perdia em nada pruma Ipanema dessas da vida, tanto pela vista quanto pela multidão que disputava o metro quadrado de areia, curtimos por lá o dia inteiro como duas crianças que estavam no mar pela primeira vez, ai ai, o que um bom dia de praia é capaz de fazer no astral de uma pessoa, por lá não tinha trajes de banho medievais, mas era um show de gente linda de deixar tonto, e na volta bicicleta no bagajeiro do ônibus, relax. A noite, remexi o guarda-roupa de nossa barraca para buscar o que de mais medieval eu poderia encontar e montei um figurino meio bobo da corte para poder me misturar a massa com mais estilo, fomos para o Clematis, o lugar mais tradicional da época dos vickings que tem na área, foi surreal, uma caverna à luz de velas totalmente lotada da fauna histórica, onde se pode beber vinho direto do barril numas canecas de barro, a certa altura começou a jam session medieval, o lugar foi ficando quente, os ânimos excitadíssimos, as pessoas batendo e dançando por cima das mesas, os músicos com seus instrumentos exóticos não paravam de chegar e tocar, foi algo inédito e fortíssimo na minha vasta experiência festiva, para encerrar com chave de ouro esses dias tão absurdamente surpreendentes. 
